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Redução da menoridade Penal. Solução para redução da criminalidade?
04/07/2015

Redução da menoridade Penal. Solução para redução da criminalidade?

Por: Sandro Caldeira

 

Após manobra política que gerou uma “furtiva” nova votação acerca da redução da menoridade penal, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quinta-feira (dia 02 julho), a sobredita redução, de 18 para 16 anos, nos casos de crimes hediondos, previstos na Lei 8072/90(estupro, sequestro, latrocínio, homicídio qualificado e outros), homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte.

O texto aprovado é uma emenda dos deputados Rogério Rosso (PSD-DF) e Andre Moura (PSC-SE) à proposta de emenda à Constituição da maioridade penal (PEC 171/93). Foram 323 votos a favor e 155 contra, em votação em primeiro turno. Os deputados precisam ainda analisar a matéria em segundo turno.

A emenda aprovada deixa de fora da redução da maioridade outros crimes previstos no texto rejeitado na quarta-feira, dia 01 de julho, como roubo qualificado, tortura, tráfico de drogas e lesão corporal grave. Ressalte-se que grande parte dos delitos praticados por adolescentes enquadram-se nesses delitos que foram excluídos, tais como roubo qualificado e tráfico de drogas, o que já torna questionável a efetividade quanto à sua aplicação.

Reduzir para 16 anos o limite da maioridade penal é um assunto importante para a sociedade brasileira no momento. É notório que a atual ação foi influenciada pela sensação de insegurança que nos rodeia, essa revolta de nos sentimos tolhidos do nosso direito básico de ir e vir com segurança. Grande parte da população brasileira vê na redução em comento a solução para a realidade atual acerca da ação desenfreada de adolescentes infratores que agem sabedores de sua impunidade. 

As pessoas estão sob forte efeito emocional, e o medo é o pior dos conselheiros. Diversos países do chamado “primeiro mundo” punem seus adolescentes mais duramente do que o Brasil. Entre eles podemos citar  o Canadá (14 anos) e Suécia (15 anos).  O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) pesquisou a legislação criminal de 53 países. Em seu relatório, verificou que  em 42 deles ou seja, 79%, a maioridade penal é alcançada  aos 18 anos ou mais. A Alemanha  experimentou reduzir esse limite, e acabou voltando atrás. Já nos EUA, 47 dos 50 Estados ampliaram as penas para menores infratores durante os anos 1990. Nos 20 anos seguintes, o número de jovens em prisões comuns subiu quase 230% .

Pelo texto aprovado, jovens entre 16 e 18 anos cumprirão a pena em estabelecimento separado dos maiores de 18 anos e dos adolescentes menores de 16 anos. Isso nos leva ao seguinte questionamento: Como será implementado esse estabelecimento, se o governo não consegue atender de forma básica a construção de penitenciárias e estabelecimentos para menores infratores? Esse local será realmente criado? Enquanto isso onde o adolescente vai cumprir sua pena? Se o adolescente passará a ser responsabilizado criminalmente pelos atos que praticar, assim como um adulto, porque dar ao mesmo um tratamento diferente, não lhe aplicando o ECA, mas também não o tratando da mesma forma que um maior de idade? Podemos levantar aqui diversos questionamentos que estão sem resposta. O tema não é tão simples.

Além disso, o fato de responsabilizar penalmente o adolescente entre 16 e 18 por certos crimes e não responsabilizá-lo por outros é uma verdadeira “aberração jurídica”. Se um maior de 16 tem capacidade de entender a gravidade de um homicídio, por exemplo, e as consequências advindas de sua prática, ele também compreende a gravidade de qualquer outra infração penal. Ou fazemos uma redução da maioridade para todas as infrações penais ou não se faz nada, sob pena de estarmos diante de uma simples manobra de “populismo penal”, sem eficácia prática alguma.

 

Vejamos os crimes que sujeitarão os adolescentes  de 16 a 18 anos a serem julgados como adultos:

Crime

Previsão legal

Pena prevista

Homicídio doloso

Código Penal

6 a 20 anos

Homicídio qualificado

Código Penal

12 a 30 anos

Homicídio com grupo de extermínio

Código Penal

12 a 30 anos

Lesão corporal seguida de morte

Código Penal

4 a 12 anos

Latrocínio

Código Penal

20 a 30 anos

Extorsão seguida de morte

Código Penal

24 a 30 anos

Sequestro (e qualificações)

Código Penal

8 a 30 anos

Estupro (e qualificações)

Código Penal

6 a 30 anos

Estupro de vulnerável (e qualificações)

Código Penal

8 a 30 anos

Epidemia com resultado de morte

Código Penal

20 a 30 anos

Alteração de produtos medicinais

Código Penal

10 a 15 anos

Favorecimento de prostituição ou exploração sexual de criança, adolescente ou vulnerável

Código Penal

4 a 10 anos

Genocídio

Código Penal e Lei nº 2.889/56

12 a 30 anos

 

Além disso, devemos perceber que a questão vaialém do limite de 16 ou 18 anos.

Com a aprovação da redução da maioridade penal, a discussão acerca do surgimento de outros efeitos além da responsabilização do adolescente autor deverá ser enfrentada.

Por exemplo, infrações penais e administrativas elencadas no Título VII do ECA deixariam de ser imputáveis a quem as cometesse contra adolescentes maiores de 16 anos de idade, como por exemplo a produção e venda de pornografia prevista nos artigos 240 a 241?Também não seria mais possível a responsabilização penal de quem submetesse adolescente dessa faixa etária a vexame ou constrangimento (artigo 232), ou lhe vendesse bebidas alcóolicas (artigo 243)? Não podemos fazer uma interpretação fracionada do Estatuto Menorista, deixando de aplicá-lo quando o adolescente for autor, mas aplicando-lhe quando for a vítima. Ou ele está sob o manto da proteção integral estatuída na Lei 806990, haja vista sua inimputabilidade penal ou está de fora, aplicando sobe o mesmo as normas penais comuns.

Ademais, a redução menoridade penal também poderia refletir na forma de obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e, consequentemente, no tráfego em nosso país. Isso porque, atualmente, o Código Brasileiro de Trânsito ( art. 140, inciso I, lei 9503/97) estabelece que um condutor precisa ser "penalmente imputável", condição que passaria dos 18 para os 16 anos.

Questões tormentosas irão surgir e precisamos estar conscientes como cidadãos que uma ação política impensada, em momento de pânico e indignação social não resolverá nossos problemas, podendo surtir efeito inverso ao almejado.